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Quem doa mais: Brasil ou países desenvolvidos?

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12 de março de 2020

As Organizações Não Governamentais surgiram por uma deficiência natural do poder público de não conseguir atender a todas as demandas sociais presentes nos países, como já visto neste artigo. As ONGs têm grandes desafios rotineiramente, seja no campo financeiro, operacional ou de comunicação. Com o voluntariado, elas conseguem ter uma mão de obra gratuita, mas isto não resolve todos os problemas.

Assim como as doações monetárias de pessoas físicas, as de fundações e empresas são imprescindíveis para as organizações sociais. Contudo, é possível perceber grandes diferenças entre as culturas de doações em diferentes países. No Brasil, por exemplo, o governo só homologou a assistência social como política pública na Constituição de 1988, quando passou a integrar o tripé da seguridade social, junto com a saúde e previdência. Com a nova lei, entidades beneficentes de assistência social passaram a ser isentas de pagar a contribuição previdenciária, o que, somente após 1993, foi conquistado pelas instituições de assistência social e de educação sem fins lucrativos, momento em que deixaram de precisar pagar impostos sobre patrimônio, renda e serviços.

No Brasil, curiosamente, só empresas optantes pelo regime de tributação do lucro real podem se creditar de doações a ONGs. Normalmente, são empresas que faturam mais de 80 milhões de reais ao ano que atuam por esse regime e podem ter o benefício fiscal. Contudo, o Brasil, além de não incentivar pequenos e médios empresários à doação, ainda dificulta que pessoas físicas o façam com o tributo do Imposto Estadual de Transmissão de Causa Mortis e Doação – que impõe taxas de 2% a 8% na transferência de recurso, dependendo o estado de origem, sendo que em alguns o imposto ainda é progressivo, demonstrando falta de uniformidade fiscal.

A diferença nas doações entre o Brasil e países como Estados Unidos e Reino Unido é gritante. Enquanto no Brasil apenas 0,23% do produto interno bruto é destinado a doações, na terra da Rainha este volume é cerca de 3 vezes maior. Se comparado aos americanos, a diferença é ainda mais brutal: o percentual do PIB destinado a doações nos EUA chega a ser 7 vezes maior. Estas diferenças foram constatadas no ano de 2015; em um estudo do Instituto para o Desenvolvimento do Investimento Social (IDIS). A pesquisa também aponta que, para doações, a pessoa física deve utilizar o formulário completo da declaração do Imposto de Renda, sendo essa a única forma possível de se creditar das doações. Apenas metade dos declarantes no Brasil utiliza este formato e somente 0,45% aproveita para doar.

A legislação brasileira possui diversos empecilhos que acabam dificultando as doações, sejam eles propositais ou não. Além do Imposto de causa mortis mencionado acima, outra dificuldade encontrada pelo contribuinte é o fato da doação dever ser feita até o fim do ano, mas o Imposto de Renda (IR) dever ser declarado apenas em abril do ano seguinte. Logo, a maior parte dos brasileiros não consegue saber com exatidão o quanto vai pagar de imposto, e isso acaba e refletindo na hora de destinar recursos às instituições do terceiro setor.

Uma maneira de facilitar e aumentar as doações no Brasil seria a possibilidade o contribuinte doar no momento de declarar o IR, como é feito no Fundo da Criança e Adolescente. Esta medida fez com que as doações para o fundo triplicassem, então, se fossem aplicadas a outros fundos, seriam muito maiores, conforme já apontado pelo estudo do IDIS.

 

O Grupo de Institutos Fundações e Empresas, no estudo Panorama do Investimento Social no Brasil, apontou uma triste queda de 33% nas doações de 2014 a 2016, e reduziu de quase 600 para 402 milhões de reais.

Nos EUA, a realidade é diferente e o número de doações vem crescendo cada vez mais nos últimos anos. Cerca de 2% do PIB é destinado a doações realizadas por pessoas físicas. Conforme estudo realizado desde 1956 pela Giving USA – The Annual Report on Philanthropy, 73% das doações que ocorrem em território americano são da iniciativa privada para a filantropia. Os bilionários Warren Buffett e Bill Gates, nos últimos anos, iniciaram uma campanha com a organização Giving Pledged para mobilizar outros ricos, como eles, a doarem pelo menos metade da suas fortunas a instituições de caridade, e desde então, mais de 40 bilionários já aderiram a causa.

 

O mesmo estudo Giving USA aponta que mais de 300 bilhões de dólares são doados por ano por estadunidenses. Desse montante, cerca de 90% é realizado por fundações familiares e pessoas físicas e o restante por empresas. Referidos dados demonstram que as doações nos EUA são derivadas de questões culturais e religiosas, mas ocorrem principalmente pela preocupação com o futuro do país e pelos incentivos do governo que induzem a prática.

 

Já no Brasil, outra preocupação é o que diz a pesquisa da Fundação Getúlio Vargas, desenvolvido pelo setor de Direito da própria instituição, que estudou mais de 75 países: entre todas nações pesquisadas, apenas o Brasil, Croácia e Coreia do Sul não possuíam um sistema de incentivo às doações de interesse social e possuem o imposto sobre causa mortis como um dos grandes entraves – alguns apontam este imposto até como punição às doações.

 

Enquanto o teto do abatimento do imposto do americano é de 10%, o do brasileiro é de apenas 6%. Nos EUA, as heranças são taxadas em 50%, o que incentiva bilionários a criarem fundações, como as famosas Buffet, Ford e Gates. A revista Forbes, que apresenta dados dos maiores bilionários do mundo, divulgou uma lista com as maiores doações já registradas: liderando a lista está Bill Gates. com sua doação de 35,8 bilhões de dólares, seguido por Warren Buffet, com o montante de 35,1 bilhões de dólares, e em terceiro lugar George Soros com a doação de 32 bilhões de dólares.

 

Claramente, antes de falar de incentivo à criação de mais ONGs no Brasil é preciso repensar a constituição fiscal do país, para que ela passe a estimular a doação e beneficiar quem realmente precisa de recursos: as instituições do terceiro setor. Instituições estas que existem para sanar as deficiências públicas da sociedade, sendo fundamentais para um futuro melhor do país.

Henrique Bonacin Filho
Diretor Corporativo
Henrique Bonacin Filho é formado em comunicação social com habilitação em jornalismo na UP e graduando em ciências econômicas na UFPR. Cursou MBA de gestão estratégica. É co-fundador e diretor corporativo da Freehelper. Atualmente é empresário e atua com sales management na área da saúde.