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O que impede as pessoas de doarem? Saiba quais são as principais barreiras para doação

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14 de maio de 2020

Apesar de ser um povo solidário, os brasileiros desconfiam na hora de doar.

Nos mais variados povos do mundo há problemas estruturais e sociais. Entender essas dificuldades é formar organizações que possam auxiliar nas necessidades da população. Essas entidades, apesar de não serem responsáveis pelos direitos individuais e coletivos das pessoas, são capazes de trazer soluções reais para que isso seja possível.

Com um papel importante, essas organizações tendem a atender nos setores privados e governamentais. Para maior liberdade na atuação, as ONGs (organizações não governamentais) são independentes financeiramente e ideologicamente. Isso garante um poder de negociação maior.

No entanto, como não possuem finalidades lucrativas, dependem de doações para continuarem funcionando e trazendo benefícios para os mais necessitados. O doador, portanto, é uma peça fundamental para que todas as ações das entidades tenham efetividade. A doação faz parte de uma consciência coletiva para o benefício de uma sociedade. Por isso, ajudar o outro acarreta numa evolução positiva para a população, seja para quem recebe ou para quem doa.

Entender o valor desse ato retrata o quanto uma sociedade é saudável e democrática. Ou seja, a consciência coletiva de um povo é mais elevada caso ela tenha o costume de doar. Pensando nos benefícios que esse ato de carinho traz para todos, por que ainda há pessoas que não têm o costume de doar?

Para entender as principais barreiras que impedem as pessoas de doarem, é preciso conhecer o perfil de doação da população. Por isso, a World Giving Index, pesquisa anual realizada por iniciativa da Charities Aid Foundation (CAF), foi feita no país brasileiro. Ela foi a responsável por trazer os primeiros números que mostram o nível de solidariedade no Brasil.

A metodologia usada pela WGI, que entrevista em torno 150 mil pessoas, permite estimar o comportamento de mais de 90% da população mundial. Ela é capaz de medir o número de pessoas que ajudou um desconhecido, doou dinheiro para uma organização ou fez um trabalho voluntário. Com isso, são obtidos os três percentuais, que, com uma média aritmética, resultam no Índice Global de Solidariedade daquele país.

Em 2009, o Brasil apareceu em 76º lugar num ranking de 153 países. Seu índice ficou em 30, já que 49% dos brasileiros haviam afirmado ter ajudado a um desconhecido, 25% declararam ter doado para uma organização e 15% disseram ter feito trabalho voluntário.

Uma posição como essa foi muito boa para o Brasil, que ficou em 5º lugar na América do Sul, ficando atrás da Argentina. Como é uma pesquisa anual, ao longo dos anos, o Brasil foi ficando cada vez mais significativo, tendo o melhor resultado em 2015. Nesta ocasião o índice do país chegou a 34, garantindo o 68º lugar no ranking. No entanto, nos anos seguintes os brasileiros não se saíram tão bem na pesquisa: caíram para o 122º lugar.

Com um índice de 23, 43% da população disse ter ajudado um desconhecido, 14% doou dinheiro para uma organização e 13% fez trabalho voluntário. A pesquisa, no entanto, não revela o que mudou no comportamento dos brasileiros para que eles deixassem de doar.

Por isso, foi realizado, entre agosto de 2017 a julho de 2018, o Brasil Giving Report, um retrato do comportamento e do pensamento dos brasileiros no que diz respeito a doações, voluntariado e engajamento cívico.

Segundo o relatório, sete em cada dez brasileiros doaram dinheiro nos últimos doze meses da realização da pesquisa. Os entrevistados disseram doar para organizações sociais, igrejas, organizações religiosas ou patrocinando alguém. A maioria dos entrevistados, 58%, disse ter doado para igrejas ou organizações religiosas.

O método de doação mais comum é o dinheiro (68%) e a principal razão é porque leva as pessoas a sentirem-se bem com a ação (51%). No entanto, poucos doadores citam a cultura de doação como uma razão para doar, com apenas uma em cada quatorze pessoas (7%) doando porque a sociedade espera isso delas.

A partir do relatório, foi possível analisar que o brasileiro doa de forma esporádica, sem comprometimento com a sustentabilidade das organizações da sociedade civil, além de doar relativamente pouco – em termos financeiros, 0,2% do PIB (Produto Interno Bruto), se comparado a países com maior tradição filantrópica, como o Reino Unido ou os EUA, com 0,5% e 1,4% de seus PIBs respectivamente.

Com isso, entendendo o perfil de doação do brasileiro, é possível listar as principais barreiras que a população encontra na hora de doar.

1. Desconfiança

Apesar de pesquisas mostrarem que metade da população doa, em média, R$20 a R$40, 88% das pessoas disseram que não devem revelar isso publicamente. Mesmo se tratando de uma boa ação, que acumula R$ 13 bilhões ao ano, isso se mostra uma barreira cultural pouco comum em outros países.

Segundo especialistas da filantropia, a crise econômica e política do país trouxe insegurança na hora de decidir contribuir com uma causa. Quem é desconfiado continuará desconfiado, já que não sabem para onde vai o valor.

É indicado, também, que o brasileiro doe para instituições próximas a ele, já que assim pode controlar onde seu dinheiro está sendo distribuído. Portanto, apesar de ser um povo solidário, não saber para onde o dinheiro vai é um impasse na hora de fazer o bem ao próximo.

Para isso, é necessário uma evolução e transparência para que o doador obtenha informações referentes ao destino da doação. Essa é uma percepção diferente de outros países como a Europa e EUA.

2. Entendendo o papel da ONG

Muitas pessoas, apesar de quererem doar, não entendem o papel da ONG como um todo. Frequentemente, as organizações não governamentais são confundidas com organismos sociais, que fazem mau uso do dinheiro e má distribuição.

Portanto, antes de tudo, é importante entender que elas podem atuar, de forma filantrópica, em diversas áreas específicas como da saúde, educação, assistencial, economia, ambiente e muitas outras.

Por não constar no direito brasileiro algo que defina a figura da ONG, de forma jurídica, ela se enquadra no Terceiro setor. Ou seja, entidades da sociedade civil que prestam serviços de caráter público sem fins lucrativos.

Com isso, entendendo o papel da ONG, é possível que mais pessoas tenham conhecimento das suas intenções e passem a doar com mais frequência.

3. Falta de clareza na causa

Outra questão que barra as doações, muitas vezes, é a falta de conhecimento pela causa. Apesar da boa intenção e efetividade no trabalho da entidade, muitas vezes, a falta de recursos de comunicação impede com que o doador entenda o objetivo daquela ação.

Na pesquisa Doação Brasil, feita pelo Idis, os entrevistados responderam que doariam mais se soubessem qual de qual modo suas contribuições são usadas e se as instituições fossem mais transparentes.

Por isso, a transparência é fundamental para que esse processo dê certo. Muitas vezes, o terceiro setor se comunica de forma diferente, não diretamente com o doador.

Então, quanto melhor for sua comunicação, melhor serão os resultados com a captação, já que mais pessoas vão entender para o que estão doando. Isso é importante para que o doador tenha mais segurança na entidade e no processo realizada por ela.

E mais importante do que isso é mostrar a proximidade do problema em questão. Na mesma pesquisa, pode-se observar que há causas que sensibilizam mais a população. O estudo indica que crianças, saúde, idosos, combate à fome e à pobreza são as que mais mobilizam pessoas. Em outras causas, por exemplo, as pessoas já não são tão sensíveis, como as ambientais, direitos humanos, combate ao consumo de drogas, moradores de rua, entre outros.

Isso não se mostra tão relevante para alguns porque não são presentes em seus cotidianos. Por isso, para que haja uma maior sensibilização, é necessário mais pesquisa e boa abordagem, para que elas entendam que isso faz parte de uma sociedade como um todo.

4. Não falar sobre doação

A empatia faz parte do ser humano. Nos colocarmos no lugar do próximo é uma questão de instinto. Por isso, é preciso falar sobre a doação para que ela se torne parte da vida e cotidiano das pessoas.

Uma boa comunicação faz com que a população conheça a entidade e a causa, criando o interesse em possíveis doadores. Por isso, educar, através de informação, é a melhor maneira de chamar atenção a causas sociais.

Mas, além de captar o doador, é preciso mantê-lo atualizado sobre as ações da organização após sua colaboração: por meio de mensagens de agradecimento e informações sobre os resultados das contribuições, por exemplo – algo que pode ser facilmente trabalhado em e-mails.

Portanto, ao ultrapassarmos essas barreiras através da informação e comunicação, o caminho da doação tende a agregar muito mais nas causas e vidas da sociedade. Como um povo solidário, o brasileiro precisa apenas se aproximar desta cultura e elevar seu nível de solidariedade e democracia, visando sempre o bem de todos.

Mellanie Anversa
Jornalista freelancer e fotógrafa
Mellanie Anversa é jornalista freelancer e fotógrafa. Ela atuou como repórter de notícias factuais no jornal Gazeta do Povo e também como assessora de imprensa na NoAr Comunicação. Durante seu período acadêmico, desenvolveu um livro-reportagem sobre pessoas que moram em uma comunidade, intitulado como A Favela Mora ao Lado.