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A indústria de Investimento de Impacto e os fatores ESGs

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09 de julho de 2020

Durante muitos anos a filantropia e o investimento foram considerados mercados separados. Enquanto o primeiro visa mudança social e ambiental, o segundo foca na busca pelo retorno financeiro. A ideia de que os dois setores pudessem estar integrados em uma mesma estrutura deu origem ao setor de Impact Investing ou investimento de impacto.

“Investimento de impacto são investimentos feitos em empresas, organizações ou fundos com a intenção de gerar impacto social e/ou ambiental mensurável, além do retorno financeiro”

O mercado de investimento de impacto vem ganhando relevância no mercado internacional na última década. Esta indústria foi mensurada em 2018 com um valor superior a US$30 trilhões (mais de R$100 trilhões) – valor mais de 10x superior ao PIB brasileiro, sendo mais de 80% dos ativos concentrado nos Estados Unidos e Europa. Com relação ao perfil do ativo pela estratégia de investimento, mais da metade está alocada em ações (51%), seguido por renda fixa (36%), ativos imobiliários (3%) e private equity/venture capital (3%).

Em países como Austrália, Nova Zelândia e Canadá, o percentual de investimentos sustentáveis já supera 50% do total de investimentos no país. A Europa está próxima deste patamar (alcançando 49% em 2018). Algumas outras regiões desenvolvidas do mundo ainda têm baixa representatividade, como os Estados Unidos (26%) e Japão (18%). Quando levados em conta os países emergentes e não desenvolvidos, o percentual é muito inferior.

Considerando o mercado de investimento de impacto na aquisição de participação societária em empresas privadas (private equity e venture capital), é estimado que 58% das empresas que receberam investimentos estão sediadas nos Estados Unidos e 21% na Europa, enquanto apenas 4% das empresas têm sua sede na América Latina. Os setores que receberam a maior parte dos investimentos sociais são: agronegócio, financeiro, educação, saúde e energia.

Autor — Foto: Valor

Fonte: GIIN; Elaboração: Valor Econômico

Atualmente, os principais indicadores utilizados para avaliar o comprometimento e impacto das empresas e investidores são baseados nas Metas de Desenvolvimento Sustentável da ONU (SDGs) e nos fatores ESGs (em português: meio-ambiente, social e governança) – com o segundo ganhando cada vez mais espaço no mundo dos negócios.

Os investimentos baseados no conceito ESG englobam inciativas que incluem:

Meio ambiente: descarte seguro e foco na reciclagem de reutilização ou recuperação como energia; redução na emissão de carbono; eficiência energética e proteção das biodiversidades e ecossistemas

Social: proteção dos trabalhadores; erradicação do trabalho infantil ou escravo; respeito às diferenças; direitos e oportunidades iguais para todos os grupos e promoção de iniciativas que fortaleçam qualidade de vida.

Governança: contratações responsáveis; utilização de fornecedores locais; preços justos e competitivos; conformidade com todas as legislações aplicáveis e governança corporativa e transparência nas informações.

Recentemente, diversos investidores apoiados pela ONU lançaram o PRI (Princípios para Investimento Responsável). Esta iniciativa se refere a uma rede de investidores que trabalham para colocar em prática seis princípios relacionados à sustentabilidade:

(i) considerar as implicações de ESGs na decisão de investimento;

(ii) incorporar iniciativas de ESGs nas empresas investidas;

(iii) divulgar os resultados e dificuldades relacionados aos ESGs nas empresas do portfólio;

(iv) promover a implementação do PRI na indústria de investimento;

(v) trabalhar em conjunto com outros investidores para garantir a eficiência da implementação dos princípios;

(vi) divulgar as iniciativas e evolução dos trabalhos com relação à implementação dos princípios.

Hoje essa iniciativa conta com mais de 3.000 investidores comprometidos, os quais somam um total de ativos sobre gestão de US$115 trilhões. Segundo relatório da Bain & Company, o retorno médio dos investimentos realizados com foco nos ESGs foi de 20% ao ano, comparado a 17% para os investimentos tradicionais.

Grande parte das empresas que fazem parte do PRI estão localizadas nos Estados Unidos e Europa, no entanto a presença de organizações na América Latina vem crescendo. Em 2018, 65 empresas se comprometeram com os princípios, somando um valor total de ativos sob gestão de US$1,2 trilhões.

De acordo com uma pesquisa realizada pela GIIN (Global Impact Investing Network), 65% dos investidores afirmam que investimentos focados nas práticas de ESGs se tornarão o padrão do mercado nos próximos 5 anos. Além disso, 72% dos gestores disseram que irão comprometer capital adicional para investimentos relacionados à sustentabilidade e 89% diz estar utilizando os princípios dos fatores ESGs na decisão de investimento e na gestão das empresas investidas.

Os Investidores

Em 2019, o valor total de ativos de investidores institucionais (grandes empresas, fundos de investimentos, fundos de pensão, fundos de private equity e private capital, hedge funds e seguradoras) no mundo somou mais de US$110 trilhões. Porém, esses investidores estão cada vez mais comprometidos em utilizar seus recursos para gerar retornos positivos na sociedade.

Diferente dos últimos 50 anos, em que investimentos privados com focos sociais eram trabalhos prioritários de fundações, atualmente o principal atuante do setor é o investidor institucional, 80% do total, enquanto pessoas físicas representam os demais 20%.

Dentro dos investidores institucionais, os fundos de gestão (fundos de investimentos captados junto a pessoas físicas e jurídicas para investir em empresas com impacto social) têm a maior participação: 64% do valor investido total. Outros participantes atuantes no mercado são as fundações (21%), os bancos (4%), as Family offices (2%) e os fundos de pensões (1%).

O TPG Capital, KKR, CVC Partners, Bain Capital, Apollo Management e BlackRock são alguns dos maiores fundos de gestão atuantes no impacto e sustentabilidade.

A Performance Financeira

Ainda, muitos investidores têm receio sobre esse tipo de investimento, o motivo é o receio do retorno financeiro ser inferior aos ativos tradicionais, que basicamente buscam as melhores oportunidades de rentabilidade, independente das consequências sociais e ambientais.

No entanto, uma pesquisa feita pela Moneyfacts, empresa de informações financeiras, avaliou a performance de alguns fundos de investimentos tradicionais e de impacto social e concluiu que, em 13 dos 20 cenários analisados, os fundos que visam retornos sociais têm performance superior aos convencionais. Além disso, mesmo nos cenários em que os fundos sociais tiveram retornos inferiores, a diferença foi inferior que 1%.

Além disso, nos últimos 16 anos, um índice de líderes globais atuando com o conceito ESG superou o índice Global 1800 (índice que contém 1.800 empresas em todas as regiões do mundo que busca estimar a evolução do mercado financeiro global) em 37%.

Em 2015, a Universidade de Hamburgo realizou um estudo com mais de 2.000 esforços de pesquisa independentes. Foi registrado que, em 63% dos casos, existe uma correlação positiva entre investimentos focados no ESG e retornos financeiros, enquanto apenas 8% mostraram um efeito negativo.

Por fim, em 2019, o banco Morgan Stanley realizou um estudo comparando os retornos de fundos sustentáveis aos fundos tradicionais entre o ano de 2004 e 2018. A conclusão foi de que os retornos dos fundos sustentáveis seguiram alinhados aos dos fundos tradicionais, no entanto, prevendo menos risco, visto que possuem menor volatilidade.

Devido a performance financeira destes fundos aliados da consciência social, diversos investidores internacionais estão cada vez mais interessados em investir em oportunidades nesta área e diversos vêm sendo criados especificamente para o investimento de impacto. Dois exemplos recentes são:

• TPG investiments. O fundo captou US$2 bilhões em 2016 (maior fundo de investimento de impacto levantado na história) e, devido a boa performance, captou um novo fundo de US$ 1,8 bilhões em 2019.

• KKR. Empresa pioneira na indústria de investimentos alternativos – captou em 2019 um fundo de US$1,3 bilhões para investimentos de impacto globais. Na data de fechamento da captação, o Presidente do fundo de investimento afirmou: “Como investidores, temos um papel significativo a desempenhar na construção de negócios que contribuem para as soluções de desenvolvimento sustentável (SDGs) e, ao mesmo tempo, gerem retornos financeiros para nossos investidores”.

No Brasil, o mercado de investimento de impacto ainda é incipiente, mas possui perspectivas de crescimento. Alguns fundos globais, como o LGT Lightstone, abriram seus escritórios no país para investirem nessas oportunidades. Além disso, fundos locais como a VOX Capital e financiadoras de projetos sociais como a BemTeVi vêm moldando este mercado no Brasil.

Para a próxima década, a perspectiva é de uma evolução do setor cada vez maior no Brasil e no mundo, tanto no sentido de investidores locais e internacionais ampliarem sua presença no Brasil, focados em investimentos de impacto, quanto no de novas empresas estarem sendo criadas sob o princípio de consciência social e ambiental.

Impacto do Covid-19 no Setor

A pandemia do coronavírus trouxe urgência de atenção a diversos temas relacionados à sustentabilidade acelerando a tendência de foco em investimentos e inciativas relacionadas aos fatores ESGs.

Ao longo dos meses de março, abril e maio, diversos canais de notícias globais abordaram o tema:

• The Wall Street Journal: A pandemia de coronavírus pode elevar os fatores ESGs: Os investidores estão fazendo mais perguntas sobre benefícios dos funcionários, gerenciamento da cadeia de suprimentos e outras prioridades ambientais, sociais e de governança.

• Reuters: A pandemia agita a consciência social de Wall Street: a compra de empresas com base em fatores ESGs estava crescendo em popularidade antes que o vírus começasse a se espalhar. Porém, o vírus está conduzindo uma reavaliação e aceleração.

• Forbes: O Covid-19 está acelerando as práticas de investimento corporativo e de sustentabilidade ESGs: Uma análise mais atenta das forças que deram origem ao investimento em ESGs e práticas mais sustentáveis antes da pandemia, revela que a pandemia está agindo como um acelerador desta tendência.

Além disso, empresas também se manifestaram:

• BlackRock lança novo Fundo de Impacto Global para avançar as metas de desenvolvimento sustentável da ONU.

• J.P Morgan defende que o COVID-19 mostrou que as ESGs importam mais do que nunca.

• Deutsche Bank promete dobrar o financiamento verde para €200 bilhões até 2025.

O mercado global de investimentos já está se adaptando à nova realidade e incorporando outros fatores além da rentabilidade nas suas análises de investimentos. E você e sua empresa? Já mensuraram o impacto das ESGs nos negócios e nos investimentos?

Gabriel Pinheiro
CEO na FreeHelper e Associate de Private Equity na Noon Capital
Formado em economia pela UFPR. Em 2017 fundou a startup social FreeHelper onde atua como CEO. Há dois anos trabalha como Associate de Private Equity, com passagem pelo fundo Alothon Group e atualmente trabalhando na Noon Capital. Anteriormente trabalhou com fusões e aquisições na Cypress e como consultor de finanças na KPMG Brasil. Também é fellow da rede global changemakers.