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A importância do psicólogo no combate ao abuso sexual infantil

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08 de julho de 2021.

Segundo dados da Ouvidoria Nacional de Direito humanos, foram registradas entre os anos de 2011 e 2019, aproximadamente, 200 mil denúncias de violência sexual contra crianças e adolescentes no Brasil a partir do “Disque 100”. Apesar de ser um número grande de casos, dados sugerem que eles são ainda maiores, já que o Governo Federal descreve que apenas 10% dos casos são notificados.

Em 2020, devido à pandemia do COVID-19, segundo dados apresentados pelo G1, houve um grande aumento no número de casos de abuso sexual infantil (um exemplo é a notificação, feita pelos Conselhos Tutelares da zona oeste de São Paulo, de um aumento de 670% nas denúncias entre janeiro e abril de 2021, se comparados ao mesmo período do ano anterior).

No entanto, os casos estão sendo tardiamente identificados e notificados. Isso se deve ao fato de que 80% dos casos de abuso sexual infantil acontecem em casa, sendo que a maior parte da identificação e do processo de denúncia é realizada por educadores por intermédio das escolas.

Ao olharmos para esses dados impactantes não é difícil perceber a importância que é falar sobre o assunto, já que são inúmeras as pessoas afetadas por esse tipo de violência.

Pesquisas da área da psicologia, publicadas no encontro Internacional de Produção Científica Cesumar, da Editora CESUMAR, Maringá – Paraná, sugerem que crianças e adolescentes vítimas de violência sexual apresentam diversos sintomas e comportamentos alarmantes. Os pesquisadores apontam também que essas crianças e adolescentes apresentam uma maior sintomatologia do que os que não sofreram abusos, sendo os padrões comportamentais mais comuns a dissociação, ansiedade, baixa autoestima, comportamentos desviantes, transtorno pós-traumático, depressão, isolamento, ideação suicida, comportamentos auto lesivos, dependência química, dentre outros.

Claro, é relevante destacar que cada criança ou adolescente terá uma reação individual se submetidos à violência sexual. Ou seja, cada um vai lidar de uma maneira única, de modo a expressarem padrões comportamentais também únicos, sendo difícil descrever um quadro específico de uma pessoa que sofreu algum tipo de violência sexual na infância.

As pesquisas apontam também que vários fatores vão influenciar no impacto que a violência sexual terá́ na vida das vítimas, como, por exemplo, a idade que tinham quando o abuso ocorreu, se há vínculo com o abusador, a forma como os familiares lidaram com a situação, como o relato da criança ou adolescente foi recebido, como a comunidade aborda o tema.

Outros pontos abordados como preditores e variáveis que podem vir a interferir na vida dessas crianças e adolescentes dizem respeito às decisões médicas, psicológicas e judiciais que ocorrem posteriormente ao ato de violência.

A partir do que foi dito até aqui, já é possível perceber os impactos que a violência sexual infligida a crianças e adolescentes têm em suas vidas. Esses efeitos podem ser tanto de ordem física quanto de ordem psicológica, podendo afetar, assim, outras pessoas que fazem contato com a vítima, familiares e demais cuidadores.

Dessa maneira, nota-se a importância do trabalho de inúmeros profissionais no acolhimento e acompanhamento dessas crianças e adolescentes. Esse processo deve ser realizado por inúmeros profissionais da área da saúde, do direito, da educação e pela sociedade civil como um todo. Todas essas áreas devem, juntas, agir para que o acolhimento aconteça da melhor maneira possível, aliviando, dessa forma, consequências que podem ser devastadoras.

Agora, falando especificamente do ramo da psicologia, o trabalho do psicólogo possui o objetivo de acolher e amenizar o sofrimento causado por essa violência tão cruel, levando o indivíduo a encontrar ferramentas para lidar com os seus sentimentos. O apoio psicológico deve ser direcionado para cada indivíduo a partir das suas próprias demandas, da sua própria história, oferecendo um ambiente acolhedor, seguro e que transmita confiança.

O profissional procura, então, fortalecer a autoestima dessas crianças e adolescentes, bem como ajudar no processo de enfrentamento das consequências do ato de violência, ensinando repertórios comportamentais de regulação emocional e desenvolvendo outros de habilidades sociais, a partir de uma escuta não julgadora, mas acolhedora.

Todos os pontos descritos até aqui dizem respeito às medidas que devem ser adotadas em crianças e adolescentes vítimas de abuso sexual. Mas, de igual forma, há medidas que abordam a prevenção da violência sexual na infância e adolescência. Elas são de extrema importância, já que podem fazer com que menos crianças e adolescentes sejam submetidos a esse tipo de violência.

Aqui é importante pontuar, mais uma vez, a necessidade de um trabalho de várias áreas de atuação. É preciso que haja políticas públicas atuantes em apoio à comunidade, a fim de que ofereçam informação, bem como melhores condições econômicas, sociais e de saúde para as famílias.

O trabalho da escola e dos educadores também é de extrema importância, já que é o local que a criança e o adolescente acabam passando grande parte do seu tempo. A educação sexual é uma boa ferramenta, e serve para ensinar crianças e adolescentes os limites de seus corpos, o que deve ser tolerado ou não, sua capacidade de identificação da violência, onde podem buscar ajuda se submetidos a tais circunstâncias, entre outros aspectos de proteção.

Abordando especialmente o papel do profissional de psicologia na prevenção, pesquisas mostram que pessoas que sofreram algum tipo de violência sexual infância e/ou adolescência podem vir a repetir o mesmo padrão comportamental de violência na vida adulta.

Dessa forma, o trabalho da psicologia com as vítimas também pode ser considerado como parte das medidas preventivas, somado, ainda, à atuação nas comunidades e famílias, orientando, identificando e notificando casos de violência sexual.

Ao nos depararmos com esses dados e o que foi trazido até aqui, é possível questionarmos o que podemos fazer para ajudar as crianças e adolescentes que sofreram, ou sofrem, abusos sexuais, bem como os adultos vítimas de violência sexual na infância ou adolescência que enfrentam suas consequências no dia a dia.

Sabemos que no Brasil existe uma rede pública que oferece atendimento integral para crianças e adolescentes que enfrentam ou enfrentaram situações de violência. No entanto, infelizmente, sabemos que essa rede não consegue oferecer, ainda, amparo a todos.

Nesse sentido, o terceiro setor aparece aqui como um dos grandes aliados que oferece cuidados e amparo para essa população. Portanto, há dois caminhos, os quais se complementam, de resposta à pergunta sobre o que podemos fazer enquanto indivíduos e sociedade: o primeiro é exigir de nossas autoridades um pleno atendimento nesta rede de proteção, bem como sua ampliação, e o segundo é oferecimento de apoio ao terceiro setor, com recursos financeiros, doações ou até mesmo com trabalho voluntário em instituições como a FreeHelper, que apoiam o trabalho de ONGs que realizam tanto o  trabalho de prevenção quanto o de acolhimento a crianças e adolescentes vítimas de violência sexual.

Um exemplo desse trabalho seria a parceria da FreeHelper com a ONG “Desenhando sorrisos”, a qual oferece apoio psicológico para crianças e adolescentes vítimas desse tipo de abuso, bem como material e orientação de medidas protetivas.

O assunto abordado aqui é bastante delicado e complexo. O artigo, no entanto, não tem como objetivo esgotar o tema, nem mesmo abordar todas as nuances e especificidades do tratamento psicológico dessas crianças e adolescentes, mas, sim, de trazer dados importantes, além de alertar sobre o nosso dever de prestar auxílio enquanto comunidade e sociedade civil.

Luiza Chamma Gomes Fernandes da Silva
Psicóloga
Formada pela PUC-PR, com pós graduação em análise do comportamento pelo Instituto de Contingências de Reforçamento (ITCR). Atua como psicóloga clínica desde 2018.